Então, no meio da semana resolvi dar uma garimpada nos sebos de cds. Não tem muita explicação, mas aquela rotina de pegar o ônibus (parênteses para revelar uma mania: eu sempre procuro ficar na fileira da direita e no corredor), descer na ensolarada e deserta General Osório e caminhar alguns quarteirões até o destino final, faz com que eu me sinta vivo e feliz. Acho que a expectativa criada pela possibilidade de encontrar um cd bom, bonito e barato libera uma dose extra de endorfina na minha corrente sangüínea. Ao menos serviu para me resgatar do subsolo escuro e lúgubre em que estava jogado, pena que o efeito teve curta duração.
Enquanto me dedicava a escarafunchar a letra D do balcão reservado aos cds de rock, entrou na loja um sujeito que se dizia interessado em realizar uma troca. Enquanto esclarecia algumas dúvidas com a funcionária, o cidadão ia retirando balas da sacola plástica que tinha em mãos. Era daquele tipo de pessoa que interrompe uma frase no meio, enche a boca, começa a mastigar e retoma o diálogo. Ou seja, o tipo de pessoa por quem tenho antipatia instantânea (sou neurastênico mesmo, e daí?!). Quando já me encontrava na letra H, percebi horrorizado que o boca nervosa se encaminhava na minha direção. Mesmo tendo a loja inteira à disposição, ele achou por bem grudar em mim como um gêmeo siamês. A partir daí foi impossível me concentrar na procura de algum tesouro musical perdido. Sua incômoda proximidade me obrigava a ouvir o incessante ruminar das enjoativas balas achocolatadas: crunch, crunch, crunch, nhac, nhac, nhac...
Pensei em escapulir para outro ponto da loja, mas aquele lugar era meu por direito, tinha chegado primeiro. Ele que se mancasse e desse o fora. A fim de deter minha crescente irritação, pus-me a mentalizar um mantra apropriado para o momento: “Não vou estrangular esse fulano. Não vou estrangular esse fulano. (crunch, crunch, nhac, nhac...) Não vou estrangular esse fulano. Não vou estrangular...”. De repente, numa prova de que a fé verdadeiramente remove montanhas, ele decidiu ir mastigar em outra freguesia. Enfim pude escolher os cds sossegadamente; acabei comprando ‘Harvest Moon’ do Neil Young, e ‘Pet Sounds Live’ do Brian Wilson.
Mas meu desafeto ainda aprontaria mais uma. Após mandar para o bucho a confeitaria que carregava na sacola, a formiga atômica não se deu por satisfeita e teve a coragem de atacar as balas que a loja deixa dentro de uma taça à disposição dos fregueses. Juro que quase caí pra trás.
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